CAUSOS
“Camisola”, o mais feio da cidade e toureiro frustrado
Antonio Ferrari, muito conhecido na cidade como “Camisola”, gozava da amizade e do respeito de muitos cidadãos. Torcedor fanático do Guarani Saltense, era sempre visto no estádio bugrino, além de participar de muitas atividades que se realizavam na cidade.
Nos anos 50, foi realizado em Jundiaí um Concurso de Feiura e “Camisola”, que viveu um período naquela cidade, foi o vencedor e contava isso para os saltenses com muito orgulho e satisfação. Na mesma época o jornal O Liberal promoveu o concurso “O Mais Feio da Cidade”, que provocou muitas reclamações de pessoas que não eram tão feias, mas que, por gozação, eram votadas e a relação aparecia nas edições do jornal durante várias semanas. “Camisola” foi um dos mais votados e isso também o agradou. Ele compensava seu visual não muito atraente com a certeza de que era um cidadão cumpridor dos seus deveres, pessoa honesta e bondosa, atributos que o faziam admirado pela população.
Enquanto desempenhava sua profissão de doceiro numa padaria da cidade, matéria em que era especialista, “Camisola” tinha um sonho na vida: ser toureiro. Nas décadas de 1940 e 1950, principalmente, Salto era visitada por grupos de toureiros que promoviam touradas em alguns locais, como no antigo campo do Ipiranga, situado entre as ruas Prudente de Moraes, José Revel, 9 de Julho e Barão do Rio Branco. Para anunciar as touradas, que aconteciam principalmente nos finais de semana, havia um desfile pelas ruas da cidade, nos quais “Camisola” sempre participava, mesmo não fazendo parte do grupo de toureiros. Fantasiado como Manolete, famoso toureador espanhol, se exibia na frente do cortejo, trajando vestimentas de lamê, calças vermelhas combinando com a blusa amarela, de tons vivos, gorro e capa esvoaçante. Enquanto a banda que acompanhava o desfile executava uma música apropriada (Eu fui às touradas de Madrid, paralá chimbum, chimbum) para os saltenses ele era a grande atração do cortejo, ostentando sua incrível magreza, evoluindo com garbo a grande capa encarnada, em longos círculos lentos, sob os aplausos dos assistentes.
Quem não o conhecia, achava que ali estava um toureiro de primeira linha, mas sua “exibição” se resumia aos desfiles e a uma participação secundária dentro do picadeiro. Ele permanecia num canto o tempo todo e quando alguém gritava “Cuidado com o touro!”, ele saia em desabalada carreira para se proteger. Numa certa ocasião, porém, ele não deu ouvidos aos alertas mentirosos e por isso o touro enfurecido o alcançou e com os chifres o lançou para o outro lado da arena, terminando o “voo” numa lamaceira de estrume dos animais.
Foi a última “exibição” de “Camisola”, o toureiro frustrado.