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CRÔNICAS EM REPRISE

Na semana passada publiquei o último “causo” neste blog, mas já vinha percebendo que o assunto estava se esgotando, pois relembrei praticamente todos “causos” que constavam do livro “Cidade Divertida Pitoresca”. Pensei: “E agora?”. Resolvi, então, relembrar minhas crônicas preferidas em 7 dos 13 livros publicados (os demais 6 são biografias e assuntos diversos).

Além dos 13 livros, teve mais um distribuído apenas aos parentes e aos mais chegados, editado quando completei 70 anos. De vez em quando pego um dos livros de crônicas, algumas das quais gostaria de vê-las republicadas, porque me satisfazem. Não sei se vão agradar também aos demais leitores, mas vou correr o risco, porque, nesta altura do campeonato, não posso deixar de me satisfazer com pequenas dádivas. Vou começar com uma publicada no livro “Crônicas da Cidade”, de junho de 2002:

O odiado ônibus das 21h30


Nada mais chato do que ter que ir embora quando a festa começa a ficar animada. Pois isso acontecia com um considerável número de saltenses, no tempo em que funcionava o “footing” em nossa principal praça. É que naquela época, princípios dos anos 60, havia muitos rapazes que trabalhavam em São Paulo e vinham passar o fim de semana em sua cidade. A maioria deles era formada por funcionários das montadoras de veículos, como a Volkswagen, Vemag, Ford, etc. Eles vinham para Salto na sexta-feira à noite e regressavam para a capital no domingo.

Não deixavam de acompanhar o vai-e-vem das garotas nas noites de sábados e domingos, mas amaldiçoavam os relógios quando eles marcavam 21h10 ou 21h15. Era a hora em que eles tinham que deixar tudo e rumar para a agência da Viação Anhanguera, que funcionava na Rua Monsenhor Couto, onde hoje se localiza a loja de presentes da esposa do Bertinho Ferrari. O último ônibus para São Paulo saía às 21h30 e não poderiam perdê-lo de jeito nenhum, sob pena de não chegar a tempo no horário de serviço, no dia seguinte.

O único lenitivo para os passageiros de todos os domingos, naquele horário, eram os comentários jocosos do sempre alegre Benone Martins, que fazia o papel de um verdadeiro show-man nos corredores daqueles ônibus barulhentos da Anhangueira. Depois de 40 ou 50 minutos, no entanto, as piadas se esgotavam e ele também caía vencido pelo sono numa das poltronas pouco confortáveis do coletivo.

Todos acordavam quando as primeiras luzes da capital surgiam e os ônibus entravam nas ruas já desertas do bairro da Lapa, pois a Marginal ainda não existia. Mais triste que a viagem era a chegada numa São Paulo quieta, já poluída, melancólica. Os bares, restaurantes e pizzarias baixavam suas portas, os modorrentos ônibus da CMTC se arrastavam pelas ruas e a gente sabia que no dia seguinte começaria mais uma longa semana.

Na chegada à Rodoviária, os sonolentos passageiros desciam e tomavam rumos diferentes, aos desejos de “até sexta!”, perdendo-se naquele emaranhado de ruas, que só iriam se tornar novamente vivas e barulhentas nas primeiras horas de segunda-feira, quando a Jovem Pan repetia à exaustão os versos de Billy Blanco: “vam’embora, vam’embora, olha a hora, vam’bora, vam’embora”...

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