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REPETECO

Uma festa na década de 50


Quando setembro chegava, toda a população saltense só pensava na Festa Setembrina. Muitas casas tinham sido pintadas, muitos ternos sido feitos nos alfaiates da cidade e as costureiras estavam sobrecarregadas com as encomendas de vestidos. O parque de diversões tinha chegado no final de agosto e estava instalado no chão de terra da Praça da Bandeira (o nome da época), com seus cavalinhos de pau que tinham que ser empurrados pela molecada, pois ainda não era motorizado. A roda gigante, as barracas de tiro ao alvo, de pesca, do pastel e outras faziam parte do parque também. Os barraqueiros se instalavam nas barracas construídas e alugadas pelo Alberico de Oliveira, nas proximidades. Ele mantinha, com seus filhos, uma barraca onde era servido o vinho licoroso ou seco de São Roque. Quanta oferta, meu Deus, será que iria ter comprador pra tanta mercadoria?

Iria. Afinal, a maioria dos saltenses estava empregada e ganhava salários razoáveis na Brasital, na Têxtil Assad Abdalla e nas indústrias novas que se instalavam na margem esquerda do Rio Jundiaí (Eucatex, Emas e Sivat). Todo mundo tinha reservado um dinheirinho “pra gastar na festa”, para desespero dos comerciantes da cidade, que abominavam esse tipo de comemoração, preferiam apenas as cerimônias religiosas. Mas não vão ser só os saltenses que comprariam: trens corriam lotados entre Salto e Itu, nos dias da festa, e especialmente no dia 8, quando era “meio feriado” na vizinha cidade. De Indaiatuba, Elias Fausto, Capivaria, Porto Feliz vinham muitas pessoas, em ônibus da linha e extras, assim como de outras cidades do Estado, pois a festa rompia fronteiras.

O movimento era tão grande, que mal se podia transitar na praça, pois ali também estavam montadas barracas das entidades religiosas locais, sorteando prendas doadas pela população. Havia ainda os vendedores ambulantes, que ofereciam doces, salgados, favos de mel, pipoca com manteiga, quebra-queixo, amendoim com uma camada de chocolate, etc.

O alto-falante da praça e do parque enchiam os ares com músicas de Zé Fidelis e a que mais se repetia era uma paródia, que alguém oferecia a alguém, que tinha um dos trechos assim: “Lá em cima vem o tiro-liro-liro, cá embaixo bem o tiro-liro-ló. Encontraram-se os dois no portão, Maria Gasogenia e Joaquim Sabonetão...” Mas tinha também Ângela Maria, Nelson Gonçalves, Cauby Peixoto e outros, famosos na época. Gritos de “números de volta” das barracas de sorteio com roletas, eram ouvidos, com o pessoal voluntário fazendo “no grito” a propaganda para atrair as pessoas.

A praça era uma grande mistura de sons, odores, cores e movimento. O encantamento durava até por volta de 10 ou 10h30 da noite do dia 8, quando os fogos de artifício começavam a colorir o céu negro. O movimento ia se resumindo a uns poucos notívagos e bêbados. Aos poucos as luzes iam-se apagando e a escuridão tomando conta da praça, enquanto as pessoas, melancólicas com o fim dos festejos, subiam aos blocos pela 9 de Julho e ruas paralelas.

Era o fim. Festa igual a essa só no próximo ano.

Até que um dia tudo se modificou...

(Do livro “Crônicas da Cidade” – 2002)

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