CRONICANDO
Recebi de presente um livro meu
Todo sábado ele vai até minha casa para pegar um exemplar do Taperá. Quando sou eu que lhe entrega, puxa conversa, geralmente comentando sobre o Palmeiras, elogiando, evidentemente, pois sabe que sou palmeirense:
- O Palmeiras está jogando bem, né, vai ficar campeão.
Outro dia ele se mostrou preocupado, pois alguém lhe disse que passei mal, que minha pressão subiu e que fui levado às pressas para a Unimed. Neguei, disse que não tinha acontecido nada disso, mas ele recomendou:
- O senhor tem mais de 40 anos, não tem? Precisa se cuidar, não cometer exageros.
Agradecido pelos “mais de 40 anos” (bem mais, evidentemente), aceitei sorrindo, mas tempos depois ele veio com uma outra preocupação: soube que eu machuquei o joelho e que não estava nem podendo andar. Desmenti, mas ele parece não ter se convencido de que não houve esse outro problema com minha saúde.
Passados alguns dias, ele me viu chegando de uma sessão de Pilates, usando camiseta, bermuda e tênis, e foi logo dizendo:
- Parabéns, já está jogando bola, hein? Quer dizer que seu joelho já está bom? Cuidado, não jogue futebol em campo grande, jogue apenas futebol de salão em quadra, viu?
O jeito foi responder que sim, estava realmente “recuperado” dos “problemas” que tive no joelho.
Dias depois, como faço às vezes aos sábados, estava numa caminhada pelo centro da cidade e a certa altura do percurso encontrei-me com ele:
- Fazendo caminhada, é? - tendo perguntado ainda até onde eu iria.
“Até o Buru”, respondi, fazendo troça.
- Até o Buru? E vai voltar a pé?
“Sim”, confirmei, o que o levou a novamente comentar que o “problema no joelho” não existia mais, não deixando de recomendar que eu me cuidasse, pois tinha “mais de 40 anos”.
Esse rapaz de cerca de 40 anos (ele sim), anda pela cidade e tornou-se meu amigo, pois embora às vezes pareça estar um tanto “fora do ar”, não denota ter problemas mentais mais sérios. Conversamos sempre que nos encontramos, numa conversa mais surreal do que normal, tendo em vista as circunstâncias.
Na semana passada ele resolveu me presentear, tendo levado em minha casa dois folhetos sobre o Peru e um livro. Ao receber o material, perguntei que lhe havia dado o livro, tendo respondido que fora um amigo seu. Indaguei se ele sabia quem era o autor daquele livro, de nome “Cidade Divertida e Pitoresca”, que lancei em 1999. Respondeu que não sabia. “Sou eu, Valter Lenzi”, esclareci, mas ele não acreditou:
- Não é seu, não, meu amigo trouxe esse livro da França. Pessoas com o nome igual ao seu tem muitas por aí...
Falar o quê?