REPETECO
Seresta numa noite fria
Antigamente eram comuns as serenatas, feitas por cantores acompanhados com pelo menos um músico ao violão, ou por um grupo de músicos. Isso acontecia principalmente nas noites frias, quando a cidade estava praticamente vazia e não havia bêbados ou pessoas chatas para perturbar.
Num mês de junho da década de 1960, como parte das festividades de aniversário da cidade, num dia que fazia um frio bárbaro, saíram pelas ruas integrantes do grupo “Os Saudosistas”, por volta da meia-noite.
Para justificar o nome do grupo, todos eles, sem exceção, estavam com uma saudade louca das noites gostosas de verão. Porém, como não podiam esquentar a temperatura, esquentavam o vinho e tomaram um garrafão para dar coragem. Levaram também um litro de conhaque para manter a temperatura durante as apresentações.
Após o aquecimento, saíram pelas ruas Batista Seratti e os demais componentes do conjunto, para tocar em frente às residências das autoridades e de algumas figuras proeminentes da cidade. O frio era terrível e um dos que mais sofria era o sanfoneiro, que tinha que ficar sentado numa cadeira colocada na carroceria do caminhão para poder dedilhar melhor seu instrumento.
Segundo o carregador de cadeiras, o músico estava tão duro de frio, que na hora em que acabava de tocar, a cadeira era retirada e ele nem percebia, continuando na mesma posição, desafiando a lei da gravidade. O que tocava o violão nem precisava usar palheta, pois seus dedos estavam duros de frio e quem tocava instrumento de sopro, via cair seguidas gotículas de gelo.
Verso da música mais tocada durante a serenata: “Quero que você, me aqueça neste inverno e que tudo mais vá pro inferno”.
(Baseado na crônica “A parte mais difícil” do livro “Boca-des-siri” – 2005)