REPETECO
Usando a franqueza
Se tem uma qualidade que admiro é a franqueza, embora seja obrigado a confessar que nem sempre a utilizo, pois às vezes existem fatores que nos impedem de falar o que pensamos. Um bom exemplo de franqueza me foi relatado pelo Carlinhos Effori, saltense que há tempos mora e trabalha em Brasília. O fato aconteceu com seu pai, Mário Effori e com outros três saltenses: Batista Ceratti, Décio Manaia e Rubinho Garcia.
Carlinhos relata que uma noite passou em frente ao Bar XV, na Vila Teixeira, onde sempre o Batista Ceratti e o Décio se apresentavam, tocando algumas músicas para alegar o ambiente. Teve a ideia de convidá-los a fazer uma serenata na casa de sua namorada Sandra (com quem veio a se casar), levando de quebra o amigo e companheiro de trabalho da Eucatex, o Rubinho Garcia, que era um bom cantor. Depois da serenata, quando Carlinhos, Mário e os amigos desciam a Rua 9 de Julho e dobraram a Avenida D. Pedro II, perceberam uma movimentação em frente à casa do juiz de Direito, na esquina da avenida com a Marechal Deodoro.
Havia uma festa ali e por isso pararam e, por sugestão do Carlinhos, resolveram homenagear o magistrado, tocando algumas músicas em frente à residência. O então prefeito Josias Costa Pinto, que participava da festa, convidou os músicos a entrar e eles executaram outras composições, tendo inclusive o juiz resolvido mostrar suas qualidades como cantor. Quanto ele terminou de cantar, os presentes bateram palmas e houve até quem gritasse um entusiasmado “Bravo!”.
Nas serenatas, sabem como é, sempre serviam um conhaque ou outra bebida mais forte, principalmente se fosse numa noite fria. O Décio, que já estava “com o pé na jaca”, como se dizia, mostra então sua franqueza:
- Esse juiz não canta merda nenhuma. Só foi aplaudido porque é juiz.
Recebeu um olhar de reprovação do magistrado, enquanto o Josias não sabia onde enfiar a cara e tratou de consertar as coisas:
- Doutor, eles são gente boa, amigos nossos. Este é o Rubinho, aquele é o Batista, ambos funcionários da Eucatex, e este é o Décio, um sapateiro excelente, que faz sapatos sob encomenda para deputados, juízes de direito, enfim para muita gente boa. Pode até fazer um par para o senhor.
O Décio, porém, volta a ser a pessoa que nessas ocasiões era muito franca:
- Hoje em dia não faço mais sapato pra filha da p. nenhum!
(Livro “Vagueando” – 2010)