REPETECO
Velhinha roubada e feriado de carnaval fajuto
Não existiu em Salto um gozador e “aprontador” como Jandir Pedroso da Silva, falecido há alguns anos. Sempre alegre e brincalhão, embora seu rosto não demonstrasse isso. Jandir dizia que não havia tristeza que o derrubasse e ele transmitia esse seu bom humor divertindo a todos... menos aos que eram vítimas dele. Às vezes suas brincadeiras pareciam maldosas, mas prontamente ele se redimia, pois era dono de um grande coração. Coração que o matou, pois foi durante uma cirurgia para a implantação de uma ponte de safena que ele faleceu.
Lembro-me de um episódio ocorrido em Pirapora do Bom Jesus, que a princípio parecia uma brincadeira de mau gosto, mas que foi imediatamente corrigida, deixando a “vítima” bastante satisfeita. Nenê Carola, Edmur Sala e eu tínhamos viajado para Pirapora a fim de fazer a cobertura da romaria de Salto que havia se dirigido para essa cidade. A “vítima”, nesse caso, foi uma velhinha, que pedia esmola em frente à igreja. Ela tinha nas mãos um pratinho onde as pessoas colocavam cédulas e moedas. Quando passou perto dela, Jandir arrancou o pratinho de suas mãos e desceu correndo a rua ao lado da igreja, enquanto a mulher gritava:
- Socorro! Fui roubada! Socorro!
Jandir deu a volta na igreja, dirigiu-se até onde a velhinha se encontrava, enquanto ela dizia “É esse! Foi ele quem me roubou!”. Tirou do bolso umas notas graúdas, o equivalente hoje a 20 e 50 reais e entregou à velhinha. Surpresa, ela parou de gritar e foi em direção a Jandir querendo abraçá-lo e beijá-lo, enquanto dizia: “Obrigado, senhor, obrigado...”.
Nessa época Jandir já era dono de um escritório de contabilidade, mas antes dava duro no açougue que tinha em sociedade com seus irmãos. Ele sempre adorou o carnaval, mas tinha dificuldades de participar dos bailes, pois tinha que sair deles e ir direto para o estabelecimento, mas certa feita surgiu uma ideia que poderia fazê-lo pelo menos fazer um descanso. Em Salto não era feriado na terça-feira de carnaval, pois as indústrias e o comércio funcionavam normalmente, por isso ele bolou uma saída para tirar pelo menos uma tarde de descanso.
No caso do comércio, ele fechava apenas quando o prefeito decretava feriado e o aviso era dado um dia antes por uma figura popular na cidade, o “Bastião Raposa”, funcionário do Cine Rui Barbosa, que percorria as poucas ruas de Salto para fazer a comunicação. Jandir, então, chamou o Bastião dando-lhe uma ordem que teria sido do prefeito da época: os proprietários das casas comerciais deveriam fechar os seus estabelecimentos ao meio-dia e essa tarde de descanso seria suficiente para Jandir recuperar suas forças e participar do último baile carnavalesco, na “terça-feira gorda”, como era chamada.
Devidamente “incentivado” por algumas moedas, suficientes para tomar umas cachaças, Bastião atendeu a ordem transmitida pelo Jandir e pontualmente ao meio-dia as casas comerciais fecharam. O prefeito da época, João de Moura Campos, saiu de casa, depois do almoço e estranhou o fechamento do comércio, perguntando aos comerciantes quem havia dado a ordem, sendo avisado que o Bastião passara avisando, como acontecia sempre. “Tragam o Bastião até a Prefeitura”, ordenou o prefeito e logo depois lá estava o coitado, confessando quem era o autor da brincadeira, o açougueiro Jandir. Imediatamente o prefeito comunicou o delegado de Polícia, que determinou a prisão do Jandir por 24 horas, suficiente para que ele fosse impedido de participar do último baile carnavalesco daquele ano.
Foi descansar na cadeia...
(Livro “Cidade Divertida e Pitoresca” – 1999)